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quinta-feira, 25 de março de 2010

"Da ferocidade criativa"

“O homem sensato se adapta ao mundo. O insensato adapta o mundo a ele mesmo. (Todo progresso depende dos insensatos)”.
George Bernard Shaw

Ah, os invejosos, os gulosos, os curiosos, os vaidosos e os apaixonados... Sem esse bando de tortos não haveria a literatura, a música, nem o teatro. Verdade! Sem eles estaríamos condenados a um monumental marasmo.

Não fossem os inconformados, não haveria flauta, nem espelho, nem calda de chocolate. Não haveria espartilho, nem mármore esculpido, nem uísque de milho. Nada de romances proibidos, nenhum ópio, nada de delírio. Nenhuma revolução, nada de telefone, avião, nem televisão. Nada de banho de espuma quente, nem remédio para dor de dente!

Aqueles que lutaram para saciar seus próprios anseios (e curiosidades) inventaram a roda; descobriram a pólvora; e transformaram o mundo numa fábrica de possibilidades.

Ora, como se sabe, a natureza humana é tão magnífica, imprevisível e desastrosa quanto à própria Mãe Natureza. Nós, humanos, apesar da consciência de estarmos vivos e do talento do raciocínio, não passamos de bichos (pensativos).

Bichos cheios de incontroláveis instintos. Mamíferos penteados, de dentes escovados e cangotes perfumadíssimos. Selvagens disfarçados de terno e gravata; salto alto e vestido. Por fora, domesticados e polidos; por dentro, uma explosão caótica (de hormônios e sentimentos vivos).

Ora, a cabeça é um órgão ferocíssimo (!) que faz sinapses, ora bélicas e maquiavélicas, noutras impróprias e fabulosas – (não por outra razão somos seres cheios de ambição).

Nascemos em branco, mas tão logo conhecemos a fome, a dor, o desejo, o amor, a inveja, a raiva, a palavra, a música, a história e a literatura – deduzimos que também podemos (tentar transformar o mundo a nosso contento).

Assim, vamos esperando, na fila da vida, pelo melhor momento. E, enquanto não chega a nossa vez, observamos o progresso alheio. Algumas vezes impacientes com a demora, noutras secretamente irritados com o sucesso de quem chegou lá primeiro- mas, sem nunca deixar de planejar nosso próprio enredo.

Tenho uma grande amiga que passou os últimos oito anos na fila- sendo assistente de cozinha. Descascou quilos de batata, picou baldes de cebola, areou mil panelas e varreu muito chão. Mas para cada tarefa realizada, usava sempre a mesma motivação: a certeza de que na hora certa era ela que teria o apito na mão. (E a cada dia que passava o sonho de ter seu próprio restaurante ia ficando menos distante).

Até quando chegou o momento gente-grande, e foi preciso escolher entre arriscar tudo (e tentar dobrar o mundo); ou continuar esperando (para ver o que ele iria oferecer).

Felizmente, ela também é do tipo insensata, inconformada, gulosa e apaixonada – metade coruja, metade leoa-, não teve dúvida sobre o que fazer: arregaçou as mangas, afiou as garras e foi (para matar ou morrer).

E é por isso que hoje estou celebrando esse nosso lado bicho (de ser)!
- Um viva àqueles que interferem nos fatos e montam, a pelo, o cavalo.
E à prerrogativa humana, que pela Mãe Natureza nos foi dada, de sermos de vez em quando pra lá de insensatos!

Pra você, minha feroz amiga,
Sucesso dobrado!

Por Maria Sanz Martins
fonte: Revista.AG, nº96

E aí? Vamos ousar?
beijok, BarbaRove.

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